André Martins – Presidente da Câmara Municipal de Setúbal
A água, bem público fundamental à vida, à saúde e à dignidade de todos os seres humanos, foi, no nosso concelho, durante 25 anos, alvo de um negócio que nunca deveria ter acontecido.
Em 2021, assumimos, perante setubalenses e azeitonenses, o firme compromisso de devolver à esfera pública a gestão da água no nosso concelho, por via da reversão da privatização feita em 1997 por um período de 25 anos.
Com a gestão da Câmara Municipal, o compromisso assumido foi o de baixar a chamada factura da água: por um lado, com a redução do preço da água: por um lado, com a redução do preço da água e do saneamento, por outro lado reivindicando que a AMARSUL, privatizada em 2014, volte a ter apenas capitais públicos para que o preço da deposição e tratamento dos resíduos não continue a aumentar só para garantir mais lucros aos privados.
Estes foram os compromissos que assumimos. Estes são, rigorosamente, os mesmos compromissos que, em 2024, um ano depois do retorno da gestão da água ao controle público em Setúbal (assinalado em Janeiro passado) e da sua entrega aos Serviços Municipalizados de Setúbal, podemos afirmar que honrámos. O custo da água, mesmo com a pressão tarifária que é exercida a vários níveis, é hoje mais baixo em Setúbal.
Este é o quadro em que os preços a cobrar em 2024, sob gestão dos SMS, continuam a ser mais baixos do que os tarifários aplicados a consumidores com consumos inferiores a 15 m3 ou abrangidos pela tarifa social em 2022, último ano de exploração pela concessionária Águas do Sado, o que reflecte o esforço do município no apoio aos munícipes com maior carência económica.
Um dos aspectos relevantes do novo tarifário é que vai permitir atenuar o défice agravado em 2024 da operação dos resíduos nos Serviços Municipalizados, sem o resolver, e tem um valor que fica muito aquém das necessidades de cobertura dos custos de pagamento do sistema de tratamento em alta, a cargo da Câmara Municipal, tendo em conta o brutal aumento das tarifas da AMARSUL.
A água, bem público fundamental à vida, à saúde e à dignidade de todos os seres humanos, foi, no nosso concelho, durante 25 anos, alvo de um negócio que nunca deveria ter acontecido. Estamos, inquestionavelmente, perante um bem público que não pertence nem pode pertencer a nenhuma entidade privada. Desde os rios que atravessam as nossas paisagens até às fontes subterrâneas que abastecem as nossas comunidades, a água é um património comum que deve ser partilhado e preservado para as gerações futuras.
A privatização deste bem comum representa uma ameaça significativa à nossa capacidade de garantir que todos lhe podem aceder. Quando é transformada em mercadoria sujeita às leis do mercado, corre-se o risco de excluir os menos favorecidos, fazendo da água um privilégio em vez de um direito humano fundamental.
É, aliás, relevante destacar que entre 2000 e 2015 se registaram mais de duas centenas de casos de remunicipalização da água em dezenas de países, número que será hoje bem mais elevado e comprova a falência dos modelos de privatização deste bem essencial. Em Setúbal sempre contestámos esta privatização e sempre assumimos que a reverteríamos logo que fosse viável. Hoje, alguns dos que a defenderam acerrimamente há mais de 25 anos e foram responsáveis pela entrega deste bem público ao lucro privado dizem-se arrependidos da opção que então fizeram. Veremos por quanto tempo…
A outra parte do compromisso que assumimos, o de exigir que a AMARSUL volte a ter só capitais públicos, fazendo com que o preço da deposição e tratamento dos resíduos não continue a aumentar só para garantir mais lucros aos privados, também está a ser cumprida. Temos, ao longo deste mandato na Câmara Municipal de Setúbal, alertado insistentemente para a situação insustentável que foi criada às autarquias com a privatização da AMARSUL, e o exponencial aumento de preços por tonelada de resíduos tratados desde então. Realizou-se uma Assembleia Municipal exclusivamente dedicada a esta matéria, debatemos o assunto em reuniões de Câmara, apresentámos uma moção no Congresso da Associação Nacional de Municípios Portugueses, aprovada por larga maioria, continuamos a alertar o Governo para o problema.
Infelizmente, nada aconteceu nesta matéria. Assumimos, por isso, que continuaremos a trabalhar para cumprir o compromisso de exigir a reversão da privatização desta empresa. Para compreender esta exigência basta constatar que as taxas cobradas pelo tratamento de resíduos, que é somada à Taxa de Gestão de Resíduos, subiram, desde 2014, em mais 56 euros. Este é o quadro que justifica uma urgente reversão da privatização da EGF, assegurando-se a sua gestão pública.
Em Setúbal, estamos a cumprir aquilo com que nos comprometemos perante as nossas populações, no que é marca essencial do nosso projecto autárquico.
O regresso da água à gestão pública é a melhor evidência dessa capacidade de honrar compromissos.